A
tristeza remete a um evento ou condição traumática real de angústia, sofrimento
ou decepção que atingiu a pessoa, sendo um estado temporário; diferente da
depressão que se torna uma espécie de meta de vida ou um “emprego mórbido” que
a mente arrumou. A depressão visa aplacar qualquer novo distúrbio ou mudança
justamente se utilizando de uma constante visão cinzenta acerca do futuro da
pessoa ou das relações sociais. É o que ALFRED ADLER chamava de “arranjo
psíquico”; um conjunto de ações ou idéias estereotipadas que tinham como meta
colocar a pessoa não necessariamente num patamar de pena perante os outros,
mas, principalmente forçar que o meio estivesse constantemente à disposição da
mesma, provendo suas necessidades e carências. ADLER elaborou tal conceito em
1910, e se pensarmos no contemporâneo distúrbio da síndrome do pânico, não
demorará em encaixarmos tal tese; sendo que o sujeito não consegue sair de casa
sozinho e necessita de um constante seguro para tal finalidade ou outras ações
pessoais.
ADLER
embora não tenha cunhado o termo pânico, foi o primeiro a perceber que tal
moléstia era uma intensificação da depressão ou medo que o sujeito acabava
permitindo que adentrasse por completo o seu ser. Por tudo isso é que a
medicação deve ser empregada com muito cuidado nos casos de depressão; sendo
que a mesma é ineficaz na etiologia citada, pois a mensagem é uma total
regressão a um período da vida onde era cuidado plenamente e não precisava se
preocupar seja com a questão da sobrevivência ou competição. Não devemos
narcotizar o medo sem a compreensão profunda do mesmo. ADLER também apontou
que o depressivo se tornava um tímido; timidez não no sentido de se expressar
ou vergonha de falar em público, mas de não conseguir compartilhar seus mais
íntimos e verdadeiros sentimentos. O tímido e o depressivo temem
constantemente o que chamou de “situação de prova”; fugindo dos encontros;
testes para obtenção de emprego e coisas do gênero; adotando uma postura de
completa ausência, o que os torna vitoriosos justamente por se evadirem de etapas
de angústia ou sofrimento, porém, com um preço altíssimo a pagar por tal
conduta.
O
medo é a experiência mais arcaica ou atávica da humanidade. Devido à questão da
própria sobrevivência do ser humano, suas raízes superam psicologicamente toda
a questão da sexualidade como força
propulsora do inconsciente proposta por FREUD. O medo remonta não apenas à
nossa finitude biológica, como muitos escritos da psicologia ressaltaram no
decorrer dos tempos. Muito mais do que o medo da morte em si, o medo passa a
ser uma experiência paralisante em todos os sentidos. É o sentido de
preservação num superlativo mais do que neurótico. Medo de morrer; ficar
doente; perder o emprego; miséria; fome; humilhação; solidão extrema; a lista é
quase que interminável e todos se sentem totalmente impotentes perante as
ameaças apresentadas. Em nossa atualidade existe mais um agravante que é o fato
de que tudo isso não é mais um privilégio do ser adulto, sendo que a própria
infância já foi contaminada pelos desafios mundanos e existenciais. É o próprio
princípio da compensação agindo; quanto mais as descobertas da medicina e
outras áreas avançam, maior o medo de perder o que foi conquistado ou pode ser
desfrutado. Nossa era se tornou a luta insana por uma segurança que jamais o ser
humano poderá reter. Sua cobiça ou desejo de novas descobertas não conseguirá
absorver fatores éticos e até religiosos impregnados em sua alma. O medo não é
direcionado apenas aos excluídos, o que seria bastante fácil de aceitação; mas
é principalmente o imperador do sucesso e abundância, vindo acompanhado de
emoções secundárias potencialmente destrutivas e contrárias a natureza de
convivência e relacionamento humano. Citando algumas: inveja; competição;
posse e principalmente desconfiança e avareza. Esta última têm como essência à
economia de energia e trabalho perante a troca, mesmo que a qualidade de vida e
dos relacionamentos da pessoa seja comprometida. A inveja, assim como a
desconfiança é uma espécie de estimulante ou droga que ocupam a mente de uma
pessoa receosa de suas potencialidades. Todos irão concordar que a inveja
permeia todos os processos sociais vigentes; alguns acham até que a mesma seja
positiva, caso alguém imite o desenvolvimento ou conquista de outra pessoa.
Porém, a essência da mesma é a comparação, e cada vez que isto ocorre nos
afastamos ou golpeamos tudo aquilo que tínhamos formado a nosso respeito. A
inveja jamais nos dará trégua ou férias acerca de uma auto-estima precária que
conquistamos; sendo uma “espada dilacerante” que corta nossa alma quando
lembramos dos grandes desejos irrealizados, mas que nosso “vizinho” talvez os
obteve. Temos um vício quase que perpétuo de achar que o fracasso apenas é
reservado para nossa pessoa. Isto se agrava pela hipocrisia social e pelo fato
das pessoas a cada dia estarem mais treinadas na arte da dissimulação ou
disfarce de sua real condição.
A
mensagem que há muito é passada e reforçada pela cultura cristã é a de que
temos de sofrer calados e absolutamente sozinhos, pois a vergonha remete a uma
moral autoritária e automática que devemos nos curvar. Em outros textos
coloquei a contradição sobre a timidez de se colocar profundamente perante
outras pessoas e a terrível sensação de solidão que sentimos. Será que esta
última não poderia ser um fator revolucionário para vencermos todas as
barreiras apontadas e humildemente tentássemos ajuda para nossa dolorosa
situação de vida emocional? Infelizmente a solidão apenas vai reforçando o medo
e a falta de treino para buscarmos precisamente aquilo que nos falta.
O tédio é a herança absoluta de toda a temática apresentada. Sua
ligação com a ansiedade é mais do que evidente, criando um conflito interno de
desejo de mudança em paralelo com a certeza da monotonia e falta de perspectiva
no presente. O tédio é a couraça ou muro que construímos após sucessivas etapas
de decepção, medo ou solidão. Não sofrer novamente é uma marca registrada de
nossa época, e o único seguro para não procurarmos novas experiências
frustrantes é o desânimo ou certeza subjetiva neurótica de que novamente não
nos daremos bem.
A
blindagem emocional novamente nos cobra um preço elevadíssimo, nos tornando
áridos nos relacionamentos interpessoais; criando inclusive exigências irreais
ou fantasiosas acerca de nossas amizades ou companheiros afetivos. Virou moda
todos falarem que à medida que vamos envelhecendo nos tornamos mais exigentes
do ponto de vista emotivo. A mentira deslavada em tal tese é a não dissecação
de nosso sofrimento íntimo, assim como a total perda de uma ingenuidade que talvez
fosse positiva no tocante a estar aberto às novas experiências. A loucura do
“seguro”, ou busca infinita, nada mais é do que um projeto mental de pleno
afastamento, medo e depressão, e racionalizamos a questão dizendo que não
podemos nos contentar com qualquer coisa. Obviamente cabe a cada um estipular
um patamar de desejo ou sonho de sua necessidade pessoal, devendo diagnosticar
o mais breve possível se determinado encontro ou relacionamento possui
realmente um futuro. O problema é que o tédio será um juiz implacável mais
cedo ou tarde da continuidade do contato, dizendo que a pessoa está apelando ou
não usando plenamente seus recursos; sendo uma espécie de ambição eterna
contida na alma da pessoa e que passa a sabotar a sobrevivência da relação. O
tédio diz ainda de alguém que não teve êxito para jogar fora seu passado ou as
vivências dolorosas. A diferença em relação à monotonia é que esta última é
basicamente um padrão de comportamento ou rotina; o tédio é um fechamento quase
que absoluto perante novas experiências. A finalidade inconsciente é forçar
um acontecimento fantástico ou supremo que retire a pessoa do protesto diário
contra um mundo que lhe causou imensa angústia. Não será fácil notar que
tal crença é absolutamente ilusória, sendo que a conseqüência é o fracasso
pessoal perante o desejo ou o próprio sonho; são as pessoas que “procuram para
não encontrar”.
O
tédio é o atestado permanente da infelicidade íntima, e sua herança é uma
espécie de hábito nocivo de mostrar para o maior número possível de pessoas sua
condição de miserabilidade afetiva e social. Desejar a todo custo chamar à
atenção para si próprio e suas mazelas psíquicas pessoais é a prova máxima de
uma pessoa neurotizada e mimada, que passa a ser improdutiva emocionalmente,
apenas sugando as pessoas ao seu redor. A neurose se junta plenamente ao
tédio e depressão, quando sua essência é uma espécie de vírus que deseja se
alastrar, recusando permanecer no inconsciente pessoal de sofrimento. O
narcisismo tão bem estudado na história da psicologia também é um produto
manipulável pelo âmbito negativo como estava dizendo, pois a autocomiseração é
uma rotina ou estratagema para quem almeja o poder de forma invertida. A queixa
sempre é o narcisismo disfarçado, ou no sentido contrário. A neurose não é
fruto apenas da ausência do prazer, mas da despotência perante o coletivo que a
pessoa enxerga e inveja. Muitos não conseguem viver uma experiência de
infelicidade ou insatisfação sem a tentação de a transportarem para o ambiente;
então resumindo tudo, o “neurótico é sempre um invasor de uma outra alma”.
Necessitamos de um ser humano que não sofra calado, mas também que não despeje
sempre seu ranço pessoal nas relações sociais. Ou resgatamos um sentido de
coletividade ou fatalmente seremos reféns de todo um psiquismo negativo que
mutilou a amizade e companheirismo. Se todos os sentimentos citados não forem
devidamente trabalhados, o selo da vingança será impresso na personalidade. O
ódio é basicamente um descendente cativo de todo impedimento ou repressão de
determinado afeto. Não se trata do fato óbvio de que jamais poderemos realizar
tudo o que desejamos, mas o ódio surge exatamente pelo oposto, quando estávamos
bem próximos ou pelo menos imaginávamos estar, em relação aos nossos sonhos e
anseios.
O
desespero advém quando não mais podemos efetuar ou reparar algo. É um tipo de
caldeirão composto por extensa culpa, repressão, timidez e indolência. É a
absoluta falta histórica do tempo certo para resolvermos os conflitos. A única
coisa positiva é a luta para tentarmos reaproveitar talvez o pouco ou o que
nunca percebemos que sobrou após os traumas que sofremos. Para tudo há um
limite, seja a infelicidade ou a própria crueldade dirigida contra a própria
pessoa. A vida não é apenas um aluguel de determinado corpo, conduta
emocional, intelectual ou social; sendo que a coisa pitoresca da mesma é sempre
nos fornecer determinadas sobras ou até migalhas para que possamos reconstruir
algo de valor. Neste ponto se concentra o potencial criativo da humanidade, que
infelizmente só é ativado perante a dor e sofrimento. Alguns pregam que
isto é uma conseqüência dos milênios da era cristã; sofrer intensamente para
galgar um patamar de regozijo. Embora não possa duvidar de tal evento, ainda
penso que a responsabilidade de todo o quadro também é a falta de prática e
ação para obtermos a satisfação. O percebimento de que somos os geradores do
conflito é essencial. Nossa mente infelizmente quase sempre deseja o atrito, e
a fatalidade é que não sabemos lidar com os opostos. Necessitamos de
aprovação social, mas nos isolamos ou ficamos solitários. Desejamos um êxtase
de prazer sexual ou companhia, mas hoje em dia descartamos qualquer tipo de
compromisso. Falamos o tempo todo de motivação que é produzida pelo dinheiro ou
posses, mas internamente nosso coração é pura cinza ou desesperança.
O
fato é que a experiência afetiva está totalmente atrelada à segurança
econômica; desejamos mais a cada dia racionalizando de que precisamos de uma
vida mais confortável para nós e nossos filhos. Sem dúvida alguma, a falácia
de que o dinheiro não é fundamental não ecoa em mais nenhum canto do planeta,
mesmo que determinado fanatismo político ou religioso tente abafar tal verdade.
O que é fundamental nos conscientizarmos é a derrocada do pessoal e íntimo,
sendo que ambos há muito tempo são aspectos totalmente secundários da
subjetividade e luta da humanidade por uma melhoria ou desenvolvimento. Relatei
no início do estudo que a ansiedade foi um dos fatores determinantes de termos
evoluído e saído das cavernas. Embora alguns vivam em casas ou apartamentos
confortáveis, o medo e insegurança pouco se alteraram na psique humana, e todos
sabem muito bem disso. Quando realmente acontecerá uma transformação pessoal do
ser humano? Qualquer ciência seja exatas, biomédicas ou humanas algum dia nos
mostrou como realmente enfrentar os desafios máximos da vida do tipo: morte,
perda ou decepção? Até agora o panorama pode ser assim descrito: o dinheiro
reina absoluto como um deus; e o que seria a descoberta do sentido da vida ou
existência é puro medo, insegurança ou agonia. Se é que poderíamos
encontrar o sentido do dinheiro, o mesmo teria a função primordial de um maior
número possível de pessoas atingirem uma condição de vida melhor, e o
verdadeiro rico perceberia tal meta. Infelizmente quem retém alguma posse neste
mundo têm como padrão à isenção de responsabilidade não apenas social;
observando insensivelmente os outros sofrerem ao seu redor. Claro que neste
ponto muita gente novamente irá racionalizar a todo custo, dizendo sobre quem
realmente merece ajuda ou dinheiro no caso. A síntese é que esta questão está
repleta de sentimentos de inferioridade e superioridade, e o problema nunca foi
à prática do dinheiro em si, mas toda a auréola de poder e misticismo que se
criou em torno do mesmo.
Deveríamos
ter um imenso cuidado com o poder instituído; seja pelo dinheiro ou qualquer
outro fator; determinada supremacia pessoal pode ser a total exclusão da
verdadeira paz de espírito. Todos já notamos a necessidade de vivenciar
determinada energia sexual ou de prazer, a fim de aproveitarmos algo de valor
perante nossa curtíssima existência neste mundo. O problema é que paralelamente
ao nosso desejo irrealizado se juntam todos os vícios e sentimentos negativos
dolorosos que a mente pode desenvolver. Nossas buscas se tornam extremamente
primárias perante a falta ou carência, nos deixando totalmente atordoados. A
verdade é que o tempo vai passando e nunca conseguimos realmente descobrir qual
o valor de tudo onde empregamos nossa energia. Insistimos em diversas ocasiões
na saudade, sem nos conscientizarmos do fator tenebroso da mesma, pois o
resultado é a impotência completa para se despertar uma nova visão de
entusiasmo pessoal e coletivo.
Até
hoje infelizmente não há estudos sobre a questão do tempo e suas relações com
os distúrbios psicológicos. Pensemos novamente na questão da ansiedade; esta
é totalmente uma insegurança em relação a um futuro incerto? Ou seria a certeza
de estar preso num profundo complexo de inferioridade passado? Quais as
perguntas subliminares que uma mente ansiosa produz constantemente? No mínimo
duas: Irei conseguir meus objetivos; quando? Será que realmente mereço tal
condição almejada? Neste ponto se insere totalmente a questão da culpa,
provando que a ansiedade e outras manifestações de desordem psíquica contém
elementos ligados a temporalidade do inconsciente pessoal. A verdade é que o
sofrimento psicológico é sempre uma falta de equacionamento perante todas as
possibilidades. Se tudo está ou pode dar errado; seu oposto deveria também
povoar a mente, ou seja, o otimismo. Este seria a certeza de possuir
ferramentas internas para tranqüilamente sair do estado de caos psíquico, tendo
a certeza de que estados de desânimo se intercalam com disposição interna para
se alterar algo. A única permanência possível é este fator inexorável da vida.
Não há nenhum ser humano condenado previamente a um estado patológico; e sem
desejar fazer elogios tolos, todos, sem nenhuma exceção dispõem de recursos
próprios para enfrentarem suas adversidades. O que falta é a estimulação
para tal empreitada, função básica da psicoterapia. É uma pena que o egoísmo
social e retraimento coletivo perpetrado pelo modelo econômico, conduzam tantas
pessoas a um desespero desproporcional. Por quantas vezes vivemos um sofrimento
absolutamente desnecessário? A paranóia nada mais é do que o desperdício da
energia vital e criativa, que é redirecionada para um labirinto de medo e
horror constantes. Isto ocorre pela falta do estímulo histórico que citei. Como
seria produtivo e importante se os pais negassem determinados presentes
materiais supérfluos e os trocassem por um elogio ou reconhecimento da
inteligência ou capacidade da criança, quando esta os demonstra pessoal e
socialmente. Tanto a hipocrisia ou necessidade de bajulação no adulto, teve sua
origem nesta carência de pontuar no período da infância sua importância na
família sob todos os aspectos: afetivo, companheirismo e potência intelectual. O
consumismo na infância reforça a mensagem de que a criança é subornada para não
expor seus sentimentos ou opiniões, não dando mais trabalho para pais que já se
encontram num stress pela sobrevivência ou dificuldade do dia a dia.
Determinada afirmação é insofismável nos dias atuais, mas, mesmo assim, quase
todos reproduzem dito comportamento sem nenhum raciocínio crítico. A
preocupação é apenas com a herança material, mas mesmo que estas palavras sejam
ignoradas, tenho o dever de lembrar a todos de que existe também um espólio
afetivo e emocional, que muitos desconsideram pela vida toda.
O
modelo de tratamento dos distúrbios psíquicos, além do excesso da medicação,
insiste numa visão mecanicista do modelo mental. Tanto a genética, quanto o
ambiente social são colocados como fatores determinantes dos modelos
comportamentais que geram as neuroses. Embora tenha dito que a neurose possui a
função de alastrar seu horizonte pessoal, cabe compreendermos o funcionamento
preciso dos distúrbios. Imputando uma boa dose de racionalidade, logo
descobriremos que a mente é muito mais do que uma soma, divisão ou herança
qualquer. Pensemos numa árvore, ela existe e faz parte de uma realidade
subjetiva e objetiva concomitantemente. A nomeação da mesma como árvore, diz da
subjetividade humana, mas ela existe independentemente do nome. E mais, podemos
a transformar em móveis, cadeiras e outros utensílios; bem como a extinguir,
causando a derrocada ambiental, fato mais do que claro. O processo da neurose
segue o mesmo fluxo, as fontes geradoras ou energia psicológica para dor ou
prazer estão disponibilizadas na nossa mente não num sentido aleatório ou
mecânico; mas em conformidade com os padrões reforçados no desenvolvimento da
pessoa. Podemos seguir a mesma trilha psicológica de nossos pais, absorvendo
todas as estruturas mentais vividas pelos mesmos; aliás, geralmente é o que
ocorre. CARL GUSTAV JUNG, foi o primeiro psicólogo a perceber a dinastia do
inconsciente coletivo sobre a psique humana. A influência não é fruto de uma
genética isolada, mas, a percepção da criança que determinado modelo mental
deve ser seguido para se expiar algum processo que a própria família renega. A
culpa na criança acompanha seu senso de solidariedade, para mostrar ao adulto
todos os pontos não resolvidos, como uma teatralização, buscando passar
algo da máxima seriedade ou mudar algo; infelizmente os pais ainda não
perceberam tal necessidade mental infantil. Como conclusão, sempre teremos
poder e responsabilidades sobre quais aspectos emocionais daremos prioridade.
Mesmo dando a desculpa de que determinada afecção mental nos tirou da rota
almejada, a mesma por si só não teria vida longa caso os benefícios secundários
da doença não atuassem constantemente como dizia FREUD. A verdade é que muitos
não querem largar seu projeto pessoal de infelicidade construído durante anos,
e tampouco querem se conscientizar sobre tal fato tão grave.
O
pilar central afetivo e emocional do ser humano é formado por uma tríplice
conjunção de elementos: poder; agressividade e sexualidade. O primeiro tem a
função básica de fornecer um feedback sobre à auto-estima da pessoa, assim como
sua importância no meio em que vive. A agressividade é uma resposta instintiva
e cultural na luta pela sobrevivência do ser humano. A sexualidade é o conjunto
histórico do desejo e paixões íntimas, quanto à mesma trocou e lutou por seu
direito de ser amada. Esses três elementos primordiais quando são distorcidos,
geram todas as mazelas e violência que acompanharam a história da humanidade. O
poder quando é compensação de uma auto-estima fraca se torna autoritarismo e
sectarismo. Sobre a agressividade não precisamos nem comentar o que se torna,
quando a mesma perde seu foco de sobrevivência; é só olharmos as páginas
policiais ou repararmos no caos social. Não irei analisar os casos de
sexualidade distorcida do tipo estupro ou pedofilia, pois são de amplo
conhecimento de todos. Nos primórdios da psicanálise de FREUD, se pensava que
as perversões sexuais eram a linha final de todo o desenvolvimento distorcido
da sexualidade. O perverso era o indivíduo que se fixou em determinada etapa
sexual, impedindo a evolução natural do instinto ou desejo sexual. Como exemplo
FREUD citava a perversão do voyeurismo, ou desejo constante de se excitar
observando o ato sexual de outras pessoas. A análise psicanalítica dizia de que
tal perversão era um seguro da pessoa contra a angústia de castração, que era o
medo do menino de perder o pênis por ter desejado a mãe, na famosa luta do
complexo de Édipo, tudo isso no plano inconsciente. Assim sendo, o voyeur
necessitava constantemente se assegurar visualmente de que o desejo sexual não
acabava em punição. Tal análise é um tanto parcial do ponto de vista global da
sexualidade. O perverso não almeja apenas a proteção de uma imagem mental, mas
reflete fielmente o modelo social de ambição e insatisfação ou tédio. Como
ADLER observou, o mesmo possui o que denominou de “complexo de colecionador”,
nunca se satisfazendo com determinado relacionamento, seja afetivo ou sexual.
Não é isto que estamos assistindo em nossos dias? Todos ficarem apenas
observando ou sempre sonhando com uma sexualidade ou relação totalmente
fantasiosa? As traições ou conflitos conjugais que o digam. Lamentavelmente a
gratidão e o companheirismo são massacrados pelo narcisismo e necessidade de
aplauso ou destaque que o meio social cobra diariamente. Pensando numa equação
ou fórmula do amor moderno, certamente o resultado seria a instabilidade, o
caráter descartável da relação, e o quanto de real investimento se despeja seja
na excitação, ou no crescimento de ambos os parceiros. O leitor ainda cobrará
qual sentimento ou sensação é mais dolorosa. A síntese, além de uma solidão
existencial e real, é que criamos várias outras problemáticas para nossa curta
existência. Desnecessária e neuroticamente aceitamos tal modelo de vida. Talvez
pudéssemos reunir tudo na palavra desilusão, não no sentido da perda de coisas
que realmente não fizeram importância em nossa história pessoal, mas desilusão
no sentido de termos de continuar a vida desgostosos ou insatisfeitos. Tudo o que
foi relatado se torna a perda do sentido verdadeiro da vida. O próprio
sofrimento é uma espécie de estrada vicinal perante o drama da existência. Cedo
ou tarde teremos de aprender que qualquer revolução ou transformação externa
irá reclamar o retorno para o íntimo do sujeito. Isto sim é genético no ser
humano; fugir de si próprio abarcando uma causa social, seja nobre ou de
extermínio coletivo, e não o desenvolvimento da neurose ou psicose como a
medicina mercantilista quer imputar. A pergunta final é quanto esperaremos para
uma tomada de consciência ampla sobre todo o processo? Será que não estamos
dando nossas vidas para situações que não deveriam tomar uma dimensão tão
profunda?
BIBLIOGRAFIA:
ADLER,
ALFRED. O CARÁTER NEURÓTICO. BUENOS AIRES: PAIDÓS, 1912.
FREUD,
SIGMUND. O MAL ESTAR DA CIVILIZAÇÃO. OBRAS COMPLETAS, MADRID: BIBLIOTECA NUEVA,
1981.
JUNG,
GUSTAV, CARL. MEMÓRIAS, SONHOS E REFLEXÕES. SÃO PAULO: EDITORA NOVA FRONTEIRA,
1986.
DEDICO
ESTE SITE A MEMÓRIA DE MINHA MÃE E PROFESSORA:
ADELAIDE DA GLÓRIA FERREIRA
DE ARAÚJO (15/01/1931- +14/03/2005)
“A DEDICAÇÃO CEDO OU TARDE SE GUIA PELA
RECOMPENSA DE UM SER HUMANO REALMENTE COMPROMETIDO COM O OUTRO”.